Não ao Marco Temporal

Por Lizandra Carpes

É possível que nos últimos dias algumas pessoas tenham ouvido falar seja nas redes sociais ou na televisão sobre “O Marco Temporal” para definir demarcações de terras para os povos originários indígenas. Mas, o que é o Marco Temporal e o que significa de fato a terra para os povos originários que citei? Primeiro é necessário relembrar que quando os portugueses chegaram ao Brasil já havia indígenas nestas terras. Quando os chamamos apenas de “índio” fazemos o que é muito comum quando se trata de um assunto que desconhecemos, colocamos todas as etnias e culturas indígenas, (indígenas sempre no plural), dentro de um “mesmo saco”.

De acordo com o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ao todo, foram registrados 896,9 mil indígenas, 36,2% em área urbana e 63,8% na área rural. O Portal Brasil revela que esta população abriga 305 etnias e 274 idiomas. Cada um destes povos tem linguagem e culturas específicas e a relação destas pessoas com o sagrado e com a natureza se difere muito da nossa. Mesmo com todo o esforço dos ruralistas de dizimar e reduzir os povos ao dia do índio, eles resistem e posso afirmar que têm em seus corações e mentes um tesouro que poucos são capazes de entender.

Muitos elementos são sagrados para os povos tradicionais originários indígenas. Um deles e dos mais importantes é a terra (Tekoha) em que nascem e enterram seus mortos, seus ancestrais. Os povos indígenas sempre sabem onde seus ancestrais foram enterrados. Por esta razão mesmo quando são expulsos de suas terras eles precisam voltar e retomar seu espaço, porque ali, naquela terra vive a história de seu povo. A terra também é aquela que dá o alimento, que abriga a semente. A semente que eles carregam para onde vão é nativa, ou seja, crioula sem modificações genéticas como as que consumimos nos dias de hoje. Os espíritos dos que se foram, as forças da natureza e o deus criador de tudo “Nhanderu” estão sempre presentes nas suas rezas, ritos e no dia a dia.

O Marco Temporal surgiu no Supremo Tribunal Federal (STF) por conta do julgamento do caso de uma aldeia, Raposa Serra do Sol, e exclusivamente para este caso. Nessa oportunidade, o STF disse que são consideradas terra tradicionalmente ocupadas pelos índios aquelas em que existiam indígenas na data da promulgação da Constituição (5 de outubro de 1988). No entanto, o STF também deixou claro que não se aplicaria a tese do Marco Temporal nos casos de “renitente esbulho”, ou seja, nos casos em que os indígenas tivessem sido expulsos de suas terras em razão de violência e agressão.

Segundo o Doutor Pedro Pulzzato Peruzzo da OAB de Jabaquara, a tese do Marco Temporal desconsidera todo o histórico de violência e absurdos sofridos pelos povos indígenas e quilombolas e força o esquecimento da história de lutas. No dia 16 de agosto deste ano houve o julgamento da demarcação das terras indígenas de algumas aldeias. Este processo causou muita apreensão entre os povos indígenas, no entanto, com a quantidade de oito votos a zero, o STF reafirma direitos dos povos originários indígenas. Foi um resultado bom, porém, não é definitivo por conta do parecer assinado por Michel Temer, que tem o potencial de paralisar processos de demarcação e acirrar conflitos e disputas entre índios e não índios.

Diante de tantos desmontes de direitos e o descaso com a classe trabalhadora, as populações mais frágeis, entre elas as indígenas, são as que vão pagar um preço alto, neste caso, inclusive com a própria vida. A história destes povos não começou em 1988.

Fonte: Portal Justificando

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